1) Mévio verificou que uma casa estava vazia, arrombou
uma janela e adentrou na residência. Uma vez em seu interior pegou um lençol, fez uma trouxa e
começou a recolher os pertences que guarneciam o imóvel.
2) Vizinho que tomava chimarrão defronte à casa observou
a ação de Mévio e chamou outros vizinhos
para ajudá-lo. Em quatro pessoas esperaram quando Mévio estava saindo da residência
e efetuaram a prisão levando o mesmo para a delegacia.
3) O Delegado lavrou o Auto de Prisão em Flagrante
(meio de início de inquérito policial que a doutrina classifica como notitia criminis de cognição coercitiva) e
ouviu as testemunhas e interrogou Mévio, que na ocasião confessou o delito.
4) Foi oferecida a denúncia, mas nenhum dos
vizinhos/testemunhas foi encontrado para prestar depoimento, por sua vez,
quando da audiência de instrução e julgamento Mévio negou ter cometido o
delito. Também não foi realizado o laudo pericial quanto ao rompimento de obstáculo.
A sentença da qual tomei ciência esta semana foi,
portanto, absolutória, em que pese a prisão em flagrante, a apreensão dos bens
junto a Mévio e o testemunho de quatro pessoas quando do inquérito.
Isto se deu ante o valor probatório do Inquérito
Policial. Como uma das características do inquérito é ser inquisitivo, logo,
sem a presença do contraditório/ampla defesa não é possível a condenação
lastreada nas provas colhidas apenas pelo delegado de polícia. Tal entendimento
que há poucos anos atrás era apenas jurisprudencial e doutrinário foi adotado
pelo Código de Processo Penal em 2008, em alteração ao art. 155, que
assim passou a vigorar:
O juiz
formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório
judicial, não podendo fundamentar sua
decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação,
ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
Mas, além das exceções previstas em lei (provas
cautelares, não repetíveis e antecipadas) não há valor probatório algum no inquérito?
Sim, há valor probatório. Segundo o STF, o inquérito pode servir de
convencimento ao magistrado, desde que complemente outras provas que foram
submetidas ao crime do contraditório e da ampla defesa, eis que a lei apenas veda
a condenação com análise exclusiva
dos elementos do inquérito.
Do Supremo:
[...] Não se justifica decisão condenatória
apoiada exclusivamente em inquérito policial pois se viola o princípio
constitucional do contraditório [...]
(STF - RTJ 59/786).
[...] A jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal, ademais, firmou-se no sentido de que “os elementos do inquérito podem
influir na formação do livre convencimento do juiz para a decisão da causa quando
complementam outros indícios e provas que passam pelo crivo do contraditório
em juízo” (RE 425.734-AgR/MG, Rel. Min. Ellen Gracie), e é válida a “prova
feita na fase do inquérito policial, quando não infirmada por outros
elementos colhidos na fase judicial” (HC 82.622/SP, Rel. Min. Carlos Velloso)
[...] HC 114592 - Julgamento:
12/03/2013 - 2ª Turma.
Por hoje ficamos então assim:
1) O Inquérito Policial possuí valor probatória
desde que corroborado por outros elementos que passaram sob o crivo do
contraditório e ampla a defesa, não podendo servir como fonte exclusiva do
convencimento do juiz.
Falta-nos ainda falar sobre as provas cautelares,
não repetíveis e antecipadas, mas como hoje é sexta deixemos para outro post.
Abraço a todos e o desejo de um fantástico fim de
semana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário